"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



quarta-feira, 15 de novembro de 2017

HISTÓRIA MILITAR NA FRANÇA - A DEFESA DE PARIS

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“A história só nasce para uma época quando ela está inteiramente morta. Assim, o domínio da história é o passado, o presente convém à política e o futuro pertence a Deus.”  
(J. Thiénot)


O futuro a Deus pertence!  A máxima de Thiénot deixa clara a imprevisibilidade do que pode acontecer com nossos projetos de vida e a incerteza da nossa caminhada.  Assim, mesmo nunca imaginando esta possibilidade, a vida trouxe o editor do Blog Carlos Daróz-História Militar a residir na França, mais precisamente em Paris, por uma temporada.

Já nos dois primeiros dias aqui, é muito fácil constatar que a capital francesa transpira história, patrimônio, cultura, tradição e, acima de tudo, encerra inúmeras referências relacionadas com a História Militar.  Nesse sentido, a partir de hoje procurarei postar aqui no Blog todas as visitas, referências, monumentos, sítios e indicações relacionadas com o tema que eu tiver condições no período em que estiver morando aqui, embora, de antemão, tenha a consciência de que será impossível esgotar o assunto, devido à sua riqueza.

Hoje começo com o belíssimo monumento A Defesa de Paris, que faz referência à obstinada defesa da capital francesa diante do cerco realizado pelos prussianos durante a Guerra Franco-Prussiana.

A Defesa de Paris é uma escultura de Louis-Ernest Barrias inaugurada em 12 de outubro de 1883 na encruzilhada de Courbevoie (hoje distrito de La Défense), no território da cidade de Puteaux, nos Hauts-de-Seine.  Homenageia a memória das vítimas militares e civis que caíram durante o cerco de Paris na Guerra Franco-Prussiana de 1870.

O escultor Louis-Ernest Barrias venceu o disputado concurso para elaboração da escultura

Contexto histórico

Em 19 de setembro de 1871, os alemães começaram a sitiar Paris. O novo governo dispôs-se a negociar com Bismarck, mas suspendeu as conversações quando soube que os alemães exigiam a Alsácia e a Lorena. O principal líder do novo governo francês, Léon Gambetta, fugiu de Paris num balão, estabelecendo um governo provisório na cidade de Tours para reorganizar o exército no interior. A partir daí seriam organizadas 36 divisões, todas destinadas ao fracasso.

Mapa mostrando o cerco de Paris pelos prussianos

Esperanças de um contra-ataque francês dispersaram-se quando o marechal François Achille Bazaine, com um exército de 173.000 homens, apresentou sua rendição em Metz, no dia 27 de outubro.

A capitulação oficial de Paris ocorreu em 28 de janeiro de 1871. Louis Adolphe Thiers, velho político francês, foi eleito pela assembleia como chefe do executivo e solicitou um armistício aos prussianos, o qual foi concedido por Bismarck. O armistício incluía a eleição de uma assembleia nacional francesa que teria a autoridade de firmar uma paz definitiva. A Assembleia Nacional Francesa reuniu-se em Bordéus, em 13 de fevereiro, nomeando Louis Adolphe Thiers o primeiro presidente da Terceira República Francesa. O acordo, negociado por Thiers, foi assinado em 26 de fevereiro e ratificado em 1º de março. A população de Paris, entretanto, recusou-se a depor as armas e, em março de 1871, revoltou-se, estabelecendo um breve governo revolucionário, a Comuna de Paris.

Em 1879, os republicanos se tornaram maioria no parlamento e se estabeleceram definitivamente no poder. O novo regime procurou distinguir-se da República de Mac Mahon, insistindo em recordar a política de defesa nacional que os republicanos haviam conduzido de setembro de 1870 a janeiro de 1871, durante a Guerra Franco-Prussiana.

Nesse sentido, em homenagem à obstinada defesa de Paris, os republicanos também manifestaram seu desejo de reintegrar a capital na comunidade nacional e acabar com as divisões nascidas da Comuna de Paris.

A construção de monumentos também afetou a ordem simbólica: a Terceira República foi percorrida do nível nacional a nível local a partir da década de 1880, por meio de uma "estatuomania" sem precedentes, que variava do Bourgeois de Calais de Rodin, ao Triunfo da República de Jules Dalou, valorizando os "pequenos patriotas", bem como a grande Pátria francesa.

Um concurso com grandes artistas

Para comemorar a defesa heroica de Paris contra os prussianos, a Prefeitura do Sena organizou, em 1879, um concurso para a construção de um monumento na rotatória de Courbevoie, localizada no final da Avenida de Neuilly, e no alinhamento do Arco do Triunfo, onde os Guardas Nacionais se reuniram antes da última batalha de Buzenval, ocorrida em 19 de janeiro de 1871 na fase final da conflito.

Cem artistas competiram, incluindo Gustave Doré, Auguste Bartholdi, Carrier-Belleuse, Alfred Boucher, Alexandre Falguière e Auguste Rodin, mas a escolha dos jurados foi pelo projeto de Louis-Ernest Barrias. O monumento foi erguido sobre o que era a rotatória de Courbevoie e ali permaneceu até 1965, instalado em uma base que, até então, havia apoiado uma estátua de Napoleão I.

A localização tornou-se o distrito comercial e financeiro de La Défense, cujo nome deriva da obra de Barrias.  Devido aos trabalhos de construção do moderníssimo distrito, a escultura foi desmontada e armazenada por vários anos, até ser reinstalada, em 21 de setembro de 1983, cem anos após a sua inauguração e praticamente no mesmo local que antes.
  
A prestigiada inauguração

Na tarde de 12 de agosto de 1883, uma grande multidão, estimada em mais de cem mil pessoas, participou da inauguração de escultura de Barrias em cerimônia presidida pelo Ministro do Interior da França, Pierre Waldeck-Rousseau.

A escultura ainda instalada sobre a base original em 1910


A cerimônia começa às 16 com uma salva de vinte e um disparos disparos de canhão posicionados no Monte Valerian, enquanto a banda de música da Guarda Republicana executava a Marseillaise. Após os discursos habituais, homenageando o patriotismo dos combatentes e a coragem heroica dos parisienses sitiados, a inauguração terminou com um grande desfile militar.

Após a partida das autoridades, o público pode finalmente aproximar-se do monumento, colocado no centro da praça instalado em uma base de granito, cercado por um portão de ferro, e iluminado por lanternas a gás nos quatro vértices.

Na inauguração, os partidários da Comuna de Paris perturbaram a cerimônia patriótica, uma bandeira vermelha foi desdobrada, e pôde-se ouvir as palavras de ordem: "vida longa à anistia; vida longa à República Social".

A escultura e suas representações

A escultura produzida em bronze representa as três figuras que simbolizam a defesa de Paris:
- Uma mulher, vestida com o uniforme da Guarda Nacional, apoiada em um canhão e segurando uma bandeira, representa a figura alegórica da cidade de Paris.
- Os defensores assumem as características de um jovem soldado mobilizado, que coloca um último cartucho no seu fuzil Chassepot. As duas figuras olham para Buzenval, o lugar dos últimos combates em janeiro de 1871.
- Do outro lado do monumento, uma menina prostrada que, com sua expressão triste e aparência miserável, personifica os sofrimentos da população civil.

A mulher vestida com o uniforme da Guarda Nacional e empunhando a bandeira representa a própria Paris. O soldado colocando o último cartucho em seu fuzil faz referência ao exército francês.


A menina prostrada , com sua expressão triste e aparência miserável, personifica os sofrimentos da população civil parisiense


Placa indicativa do monumento

Barrias inspirou-se no trabalho de Amédée Doublemard, A Defesa da barricada de Clichy, também conhecido como monumento ao marechal Moncey, da Place de Clichy em Paris.

O editor do Blog Carlos Daróz-História Militar diante do monumento A defesa de Paris

O monumento emprestou seu nome ao distrito La Défence, que se tornou o principal centro de negócios e finanças da Europa.

O distrito de La Défence, maior centro financeiro da Europa, recebeu seu nome devido à referência do monumento de Barrias

Referências
- BEST, Janice. Les monuments de Paris sous la Troisième République: Contestation et commémoration du passé. Paris: L'Harmattan, coll. Histoire de Paris, 2010.

- LAVALLE, Denis. Le monument de la Défense et la statuaire du XIX siècle. Paris: Archives départementales des Hauts-de-Seine, 1983.

Um comentário:

  1. Olá Carlos,

    Visite o musée de l'armée construído por Luiz XIV, terá material para um ano no mínimo e por toda Paris existem monumentos e homenagens aos combatentes.

    Sou fã do seu blog, que aliás é muito bom,

    Abraços Antonio

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